Sobre razões (sempre minhas e da minha facção) e desrazões (do outro) em politica. Júlio Cèsar Silveira

Tudo se justifica (?)

Tudo se ‘justifica’ em nome da religião.

Tudo se ‘legitima’ em nome da ideologia.

Não, não estou a dizer que a humanidade precisa da religião ou da ideologia – se é que há distinção entre as duas, eu as tomo como expressões de ideias supraordenadas carregadas de afetos moralizadores – para derramar sangue.

Uma leitura economicista diria que a razão da guerra é a escassez. Como não tem recurso suficiente pra todo mundo ou de acordo com que cada parte julga de direito há a refrega.

A religião ou a ideologia seriam pretextos para parecer que a luta não se dá por razões essencialmente materiais.

Fato é que a história da humanidade é uma história de disputa, de conflito, de guerra, em que cada parte envolvida se naturalmente não acha racionaliza que representa o bem, o lado certo, e cria sua narrativa.

A visão economicista ou materialista tem o seu apelo reforçado quando se vê que ao longo da história aliados se tornaram inimigos e inimigos se tornaram aliados conforme os interesses forem convergindo ou divergindo, vide EUA e Iraque ou EUA e Sadam Hussein.

Cada leitura tem ou pode ter o seu elemento de verdade. Porém, nas guerras dois fatores se mostram constantes.

  1. Tribalismo: o outro lado precisa ser reduzido a uma coisa só. Isto significa que todos os indivíduos são julgado pela suposta média moral ou pelo modus operandi de quem governa o seu grupo.

Assim é possível relativizar a morte de inocentes porque são automaticamente culpados por pertencerem ao grupo opressor.

  1. Mito do mal puro: é preciso acreditar e/ou fazer os outros acreditarem que o outro lado é a plenitude do mal e que o seu grupo é a plenitude do bem.

Que a sua violência é de resistência e prevenção e que a do outro é por pura maldade.

Sem tribalismo é preciso pra cada pessoa encontrar motivos pra odiá-la. Dá muito mais trabalho. E não dá pra ‘justificar’ nem ‘relativizar’ ataque, sequestro, tortura estupro e execução de inocentes.

Sem o mito do mal puro é preciso reconhecer que o outro lado poder ter suas razões e que o meu lado não é santo, puro e imaculado. Ou seja, que cada lado tem suas contradições.

Com tribalismo e o mito mal puro não é possível a pacificação.

Quem idolatra Israel, que só ora ou só trabalha pela paz entre judeus não também entre palestinos, assim como quem disfarça seu ódio aos judeus com antisionismo e suposto defensor da Palestina Livre não está disposto a promover a pacificação.

É viver em “Alice no País da Maravilhas” ou no “Fantástico Mundo de Bob” acreditar que todos perdem com a guerra.

Tem muita gente que ganha. E dos dois, ou melhor, de todos os lados envolvidos. E os inocentes que se ferram. Outrossim, de todos os lados envolvidos.

Júlio César Silveira, psicólogo, mestre em Ciências da Religião,

Texto relacionado: Saramago, O fator Deus https://bibliaepsique.com.br/2023/10/02/o-fator-deus/

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